Entrevista – junho 20 2018

Entrevista: “Compromisso é marco na luta contra violência”

O assessor de advocay da Aldeias Infantis SOS, Fabio Paes, fala sobre adesão do Brasil à parceria global pela infância.

Neste junho, a Coalizão Brasileira pelo Fim da Violência contra Crianças e Adolescentes, que tem como objetivo mobilizar a agenda nacional e garantir políticas públicas para o público infanto-juvenil obteve a adesão do Governo Federal à ‘Parceria Global pelo Fim da Violência contra Crianças e Adolescentes’, liderada pela Organização das Nações Unidas (ONU).

A participação é considerada um marco na história do país, já que representa o compromisso do Brasil em elaborar políticas públicas para erradicar a violência contra crianças e adolescentes.

Com o ingresso do Brasil na Parceria Global, o governo federal assume o compromisso em desenvolver um Roteiro Nacional (Roadmap) de ações integradas para balizar as avaliações do Plano Decenal dos Direitos Humanos de Crianças e de Adolescentes (2011-2020). Além disso, segundo o acordo, se compromete a desenvolver um sistema de indicadores sobre crianças e adolescentes, com foco na identificação das violações de seus direitos.

Para falar mais sobre a importância dessa adesão, entrevistamos o assessor nacional de advocacy da Aldeia Infantis SOS, Fabio Paes.

A Coalizão Brasileira comemora a adesão do Brasil à Parceria Global pelo Fim da Violência contra Crianças e Adolescentes’. O que essa adesão significa na prática?

Bom, primeiro que o Brasil entra no cenário internacional como um país que começará a prestar contas sobre dados de violência contra crianças e adolescentes e mais, também apresentará boas práticas. Sair daquela coisa que ‘a realidade está difícil; os dados não são favoráveis’. E, a partir disso, apresentar soluções para desenvolver um sistema de indicadores sobre crianças e adolescentes, com foco na identificação das violações de seus direitos.

Quais serão os próximos passos para o governo brasileiro?

Os próximos passos já vêm sendo desenvolvidos, como por exemplo, uma reunião permanente com o governo. A Coalizão se encontra pessoalmente a cada dois meses, mas também existe uma agenda afirmativa. Uma das prioridades deste grupo é a questão da obtenção de dados.

Hoje, nós não temos os números atualizados diariamente sobre a situação das crianças que perderam os cuidados de seus familiares, serviços de acolhimento ou mesmo sobre as crianças que foram separadas de suas famílias.

Na última reunião foi pautada a prioridade do governo brasileiro apoiar o financiamento de uma iniciativa que o Brasil consiga construir um sistema integrado de informação.

Para conseguirmos essa plataforma a Coalizão foi até Belo Horizonte, onde fica a ChildFund, parceira da Aldeias Infantis e que apresentou um núcleo de inteligência social, que está na PUC de BH, onde existe uma estratégia para se criar uma plataforma  no Brasil para unir informações desde IDH, IBGE, até mesmo do IPEA. Dessa forma as informações sobre como as crianças estão sendo cuidadas poderão ser mapeadas por esse sistema.

Qual foi o resultado desses últimos encontros?

Esta coalizão fez um levantamento das informações necessárias e contribuiu para a próxima consulta pública do IBGE, do próximo Censo. O IBGE ainda disponibilizou o questionário que deve aplicar em todo o Brasil. Ainda criamos um acordo enquanto coalizão onde cada organização vai analisar esse questionário e contribuir. 

A Aldeias Infantis colaborou ao apontar para a necessidade de se criar um questionário sobre crianças que vivem com algum familiar, outra casa, com os pais ou com as mães, que é o que a ONU chama de cuidado informal e esses dados no Brasil nós não temos. Em breve também será realizada uma reunião da coalizão junto com o IBGE para definir o cálculo e a metodologia.

Qual você acredita ser o principal desafio para a implementação efetiva das ações que se esperam no Brasil em relação à violência contra a criança e o adolescente?

Estamos vivendo em uma crise política há alguns anos e percebemos que isso tem gerado o enfraquecimento e até a retirada de algumas prioridades dentro das políticas públicas. Acredito que o nosso tumor seja a falta de investimento público nas áreas principais e básicas, como direitos humanos e assistência social.

Nós também percebemos que sem a visão de um orçamento integrado, de saúde, educação, assistência, social, lazer e cultura, não adianta a gente falar de enfrentamento à violência, se não será apenas um band-aid. Precisamos atuar de maneira mais integrada.

A coalizão é formada por organizações sociais. Como pessoas podem ajudar a combater a violência contra a criança e adolescente?

O Brasil nesse sentido é inovador no cenário internacional, porque começou um movimento há dez anos de uma rede que nós valorizamos muito, que é a “Não Bata, Eduque”, uma rede criada para o enfrentamento da violência contra a criança.

A grande meta dessa rede era que existisse uma lei que dissesse o seguinte: bater em criança é crime. Com a Lei Menino Bernardo (13.010/2014), o Brasil acaba falando o seguinte, uma palmada é um crime.

Agora, a partir desta lei a demanda que o país tem é de romper com a cultura e de justificar a educação violenta. Rompendo com isso, temos que criar uma cultura de bem cuidar, que é o início de uma educação positiva.

O grande desafio para as pessoas é de fazer parte desse movimento, da coalizão e também para que esse tema seja uma demanda das famílias e das escolas. As pessoas têm que buscar mais metodologias, informações e como romper com esse ciclo. 


.

Leia a carta