Com o rosto escondido pela aba de um boné multicolorido, Eduardo, 13 anos, aproveita a tarde ensolarada para empinar pipa com os amigos e irmãos sociais no gramado da Aldeias Infantis SOS do Rio de Janeiro. Quem o vê assim, feliz e se divertindo, mal pode imaginar por tudo o que ele já passou.
Dudu, como prefere ser chamado, passou por diversos abrigos desde muito pequeno. E mesmo com a pouca idade, tinha um histórico impactante: comportamento explosivo, inúmeras tentativas de fuga e nenhum interesse em frequentar a escola.
Desacreditado por muitos, o menino chegou à Aldeias Infantis SOS do Rio de Janeiro em setembro do ano passado, depois do fechamento do abrigo onde estava. Com semblante sério e olhar desconfiado, queria fugir a todo custo. “Todos os dias ele me dizia que não queria ficar aqui, que iria embora e que nós não poderíamos impedir. Mas eu conversava com ele, dizia que ficaria triste, que o amava e que preferia que ele ficasse conosco”, conta Tina, sua mãe social.
Foram as palavras carinhosas da mãe social aliadas ao trabalho e à atenção da equipe técnica que contornaram a situação. O garoto, que não deixava ninguém se aproximar, já aceita receber beijos e abraços de todos. A expressão fechada perdeu espaço para um sorriso sincero, com direito a covinhas à mostra.
A transformação
Dudu se tornou mais alegre e brincalhão. De volta à escola, estuda e tem boas notas. Participa da organização da casa e pratica jiu-jitsu. Também se diverte durante as oficinas realizadas na Casa de Oportunidades, oferecidas a todas as crianças do Morro do Banco, comunidade vulnerável próxima ao programa.
É nessa Casa de Oportunidades que, durante as tardes, o adolescente tem reforço escolar, aulas de arte, cultura e culinária, e desenvolve novas amizades. Um desses amigos é Ueinerson, apelidado de Tofu, que recebeu o título de ‘melhor amigo’. Juntos, jogam bola, ouvem música e, lógico, empinam as pipas feitas por eles mesmos em uma das oficinas.
Sobre a importância da Aldeias Infantis SOS em sua vida, ele é certeiro: “aqui é a minha casa. A tia Tina gosta de mim. Todo mundo aqui é joia e quer o meu bem”, diz, um pouco envergonhado, ao demonstrar que ainda não sabe lidar com sua recente popularidade e com o interesse dos outros em sua história de vida.
A condução da tocha
A fama repentina veio depois da decisão da Vara da Infância em escolher Dudu para conduzir a tocha olímpica, símbolo do maior evento esportivo do mundo. “Quando o juiz viu o quanto ele melhorou nestes meses conosco, com comportamento mais sereno e melhor desempenho escolar, quase não acreditou”, afirma Hamilton Vaz, gestor do programa do Rio de Janeiro. “Ele é um menino bom, de bom coração. Só precisava de carinho, cuidado e proteção. E isso nós temos de sobra para oferecer”, completa.
Com simplicidade e orgulhoso de si, Dudu fala sobre a participação na condução da tocha, em 4 de agosto, um dia antes da abertura dos Jogos Olímpicos, em Bangu, um bairro periférico do Rio de Janeiro. “Eu não fiquei nervoso, nem tive medo de cair. Eu representei um monte de crianças. E isso é muito importante”.
Para Tina, essa participação plantou uma semente no coração dele, de que é possível sonhar. “Quem sabe um dia ele vira um atleta e vai para as Olimpíadas”, diz. “Eu quero mesmo é ser jogador de futebol do Barcelona”, retruca o adolescente.